6 de dezembro de 2006

Os caquinhos que Marina colou!!!

A geração teen praticamente desconhece a cantora/compositora Marina Lima e, se a conhece, tem a impressão que assim como Betânia e Gal, é uma artista ultrapassada e faz música pra poucos. Eis que depois de anos entre a depressão, trabalhos sequenciais que se desembocavam no universo confessional e ostracismo musical, Marina Lima lança no mercado fonográfico um novo disco: "Lá nos Primórdios".
Com esse trabalho, Marina mostra que os caquinhos do passado foram todos colados por amor ao bom e velho rock in roll e a música pop. Com mais um difencial: o rock de Marina está cada vez mais recheado de batidas eletrônicas, poesia concreta, versos crus e palavras cada vez mais alternadamente faladas e/ou cantadas. Nada por acaso. Foi um caminho percorrido naturalmente até aqui.
A música de abertura do disco "Três" já dá os primeiros sinais do que virá, ou melhor, do que não virá mais: o universo das dores de discos anteriores como
Marina Lima (1990), O Chamado (1994)e O Pierrot do Brasil (1998). Os versos são diretos:

"Não há lugar pra lamúrias/
Essas não caem bem/
Não há lugar pra calúnias/
Mas por que não nos reinventar?

(Marina/Antônio Cícero)

Embora esse grito de alegria de agora seja interessante, foi em sua fase introspectiva que saiu parte de músicas que afirmaram Marina em plena maturidade artística que pode ser conferida em músicas como "O Chamado", "Meus Irmãos", "Não sei dançar", "Deixa Estar" e a primorosa e tristonha "Pierrot".
Em Lá nos Primórdios, Marina Lima é certeira em tudo. Iniciou uma sequência de shows nas noites sudestes, experimentando sons e músicas, de onde surgiu exatamente o show Primórdios. Nadando contra a maré, Marina ousa mais uma vez ao pegar um show e transformar/adaptar em um cd, produzir e negociar com uma gravadora a distribuição.
E está aí o "Lá nos Primórdios, um cd com doze faixas das quais duas Marina revisita sua própria obra mostrando que há muito vigor ainda nos rocks e baladas dos nos 80/90 como em "Difícil" e "Meus irmãos", esta última com versos fortes e proféticos:

"Os homens podem muito pouco/
O tempo sempre sabe mais como agir/
Tem sempre tanta coisa em jogo/
Vaidade, poder, o existir"

Soa até atual demais a letra. Para quem havia decretado a "morte" de Marina, ela prova que voltou a todo vapor. Primórdios é um disco com o sentimento rock in roll, com letras inteligentes. Sem deixar no canto seu lado de intérprete, bem registrado em "Pessoa", "Ainda é cedo" e "Ela e eu", em "Lá nos primórdios", Marina retoma seu lado intérprete com a canção de Chico Buarque "Dura na Queda", com alternância do violão e do baixo até o ápice com o refrão samba/bossa:

"O sol ensolararará a estrada dela/
A lua alumiará o mar/
A vida é bela/
O sol, estrada amarela"


Todo esse percurso é circular como uma ciranda, na qual Marina mergulhou inserindo samples e batidas eletrônicas para se aproximar do Nordeste, de onde vieram suas origens genealógicas: pais e avós. "Valeu" que aparece no início do cd retorna no finalzinho remixado:

"Portanto eu criei essa ciranda/
E aposto no que a vida prometeu/
Na paz, na guerra ou num jogo de damas/
Era pra jogar você e eu"


A Marina irônica também está de volta. Ela que sempre abordou os temas relacionados a sexualidade e comportamentos em décadas anteriores, agora aos 50 anos fala de amor de forma menos panfletária. E os questionamentos seguem seu rumo rítmico.

"Eu vi no mapa do mundo/
Que Anna Bella desenhou/
Que a região do desejo/
não é exatamente a do amor/

Já que é assim me pergunto/
Uma coisa que pensei/
Por que as mulheres também não podem ter a sua sauna gay?"


A ciranda, as batidas, os samples, a percussão, a voz...tudo mostra que os Primórdios é um retorno de um Rio de Janeiro que estava aí presente o tempo todo e nao víamos, de uma mulher independente que não ouvíamos e de um trabalho autoral que já fazia falta. Em 1984 Marina tomava as paradas de sucesso com a abertura da novela Roda de Fogo com "Pra começar", dela e Antônio Cìcero.
Os versos... "Pra começar quem vai colar os tais caquinhos do velho mundo...", continuam atuais nos dias de hoje e só mostram que depois de muito tempo, Marina começa a colar os seus caquinhos e chega inteira depois de uma viagem aos Primórdis dela mesma e de sua obra.


P.s.: Agora é esperar que um dia o DVD do show Primórdios chegar nas lojas de João Pessoa porque o show talvez ou jamais por aqui aporte na "província". Uma pena!!! Quem sabe um pulinho em Recife resolva a ânsia de vê-la no palco?!!!

3 comentários:

Anônimo disse...

Não sei dançar... boas recordações agora, Wagner. Bom saber que Marina está de volta... ou melhor, que nunca foi.

Anônimo disse...

Sim, ela ta de volta!
Marina não esteve totalmente ausente, dirão os fãs fanáticos como eu.Mas , mesmo sendo doente por essa mulher(rss)..tenho que reconhecer: se em PIERROT havia uma nítida vontade de afirmar q tava de volta com tudo após a depressão( "..sim, eu resolvi me ausentar..voltei pra te dizer que aki no meu Brasil outra flor não há.."), em LÁ NOS PRIMÓRDIOS esse sentimento se sente sem que isso seja expresso de forma direta, em palavras.O retorno trunfal se sente. Não será um sucesso comercial,como os'saudosos' anos 80(ou somo os saudosistas tanto esperavam que fosse), mas se percebe um Marina madura,grande, plena, inteira.Sem faltar caco nenhum.

Anônimo disse...

Nossa, que coisa linda este teu texto! Totalmente a altura do trabalho desta mulher maravilhosa, rockeira de primeiríssima qualidade!!
Muito bom! Parabéns Wagner!!!
Marina é tudo de bom!