26 de janeiro de 2007

cantando na contramão


O que nos toca a sensibilidade nem sempre nos embala o ouvido. Com a chegada do verão, inúmeros shows estão sendo realizados em João Pessoa, capital da Paraíba - para os menos avisados em geografia - e uma expressão tem me soado como lugar comum quando os artistas definem seu estilo ou quando o transpõe para o palco: a fusão de ritmos nordestinos.
Primeiro é preciso refletir que Nordeste é esse e que ritmos são esses. Nada mais natural entender que esse espaço geográfico que vivemos nada mais é do que uma construção discursiva, trazendo para si a representação de um conjunto de personagens, comportamentos, estéticas e manifestações sócio-culturais. E que ritmos são esses? Desde que Chico Science estourou com o movimento mangue beat - ou bite !? - que virou moda, lugar comum e bengala discursiva para centenas de artistas e grupos em recorrer ao caldeirão do 'Science', que já usava os ingredientes do Alceu Valença dos anos 70, que por sua vez, batia continência para as proezas rítmicas de Jackson do Pandeiro.
E aonde eu quero chegar, vocês poderia estar perguntando?!!! Na fusão de ritmos. Para o mangue ela foi certeira, abriu portas e alardeou os sons de toda uma geração. Mas, e agora? A fusão me dói os ouvidos quando não justificada pela pesquisa musical, coesão artística, proposta conceitual de uma comunicação com o público. (é, arte não é só fazer por fazer. é fazer também pra comunicar!).
Com os shows do projeto 'Estação Nordeste', levando artistas paraibanos às praças, Centro Histórico, e orla me dá uma sensação de olhar e ouvir o mesmo passado de antes, salve algumas exceções. Os grupos e artistas novos misturam rock com forró, ciranda, maracatu - de onde mesmo esse maracatu? - reggae e uma misturada que não tem fim. Some-se a isso artistas experientes fazendo quase a mesma proposta.
Foram dias e dias ouvindo forró, xote, maracatu, frevo, ciranda, coco, reggae, todos parecidos como se fossem o mais genuíno produto paraibano. E outros, apenas recorrem às obras de poetas para musicar versos bonitos. Mas espera aí. Poesia nem sempre é música! Às vezes, poesia cantada às vezes continua sendo poesia e não música. Soa chato.
Influências que ecoam -
Na falta de uma discussão aprofundada, como se fazia no período do Jaguaribe Carne e até mais recente do Musiclube da Paraíba, os artistas ainda se guiam pelas notas musicais que ecoam de Pernambuco. Volto a dizer, com raras exceções de música inventiva e inquietude artística, a exemplo de Paulinho Ditarso, Gláucia Lima, Realidade Crua - e Kaline -, Totonho e os cabra, Escurinho.
Em caso de comparações, ouvir a mistura ou fusão de ritmos me remete sempre às comparações, seja com Chico Sciense, Otto, Mônica Feijó, DJ Dolores, Bonsucesso Samba Clube, Ortinho, Nação Zumbi, Cordel do Fogo Encantado só pra começar...mas cada um em "sua praia" musical. Tudo isso porque a nova geração da Música Paraibana não consegue ver a beleza que brota do experimentalismo, a proposta antropofágica e o anarquismo cultural do Jaguaribe Carne, mais paraibana do que o que se faz no 'agora'. Ironia ou não, os dois maiores expoentes da Música Paraibana no cenário nacional atual são Chico César* e 'Totonho e os Cabra', dois díscipulos de Pedro Osmar e Paulo Ró. Quem será que está na contramão?
"O meu corpo samba é uma vontade negra de liberdade..." Pedro Osmar.
* Chico César até começou mostrando forrós e outros ritmos. No entanto, a busca por um trabalho mais coeso resultou em discos profundos e conceituais como 'Mama Mundi' e 'De uns tempos pra cá'.

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