11 de dezembro de 2008

Outro dia, outro corpo

SESSÃO: COTIDIANO

Por Wagner Lima


Foto: Internet


Estava só. No ouvido ecoavam frases soltas... resquícios de declarações de amor. Naquele momento teve a nítida sensação da amplidão daquela sala que se tornara pequena para os movimentos das acrobacias de amor do casal. Olhou em volta da sala vazia e pairava sob seus ouvidos o eco dos seus passos por todo apartamento. Nas mãos, um buquê de rosas vermelhas, envolvida em papel artesanal e fitas, muitas fitas cor de rosa. Não havia mais sentido estar ali diante daquele vazio que era também uma representação do que sentia por dentro: os ecos de si próprio.

Largou o buquê no chão. As gotas de orvalho escorriam sobre o plástico. As pétalas viçocas se desfolharam com a brutalidade das mãos ao lançarem-nas ao chão. Não podia acreditar que tudo havia desmoronado de uma única vez em apenas uma manhã de trabalho. Na volta para o almoço, os quadros expressionistas não estavam mais nas paredes da sala. As louças de tradição familiar haviam sumido. Apenas o tic tac cortava o silêncio desolador daquela sala. O som dos mensageiros do vento foram com os novos ventos e ele ficou ali parado. Com o cigarro no dedo e atordoado tentou lembrar de uma música qualquer, mas qualquer mesmo que representasse tudo que sentia naqueles instantes pertubadores. Então, lembrou da música, do que perdeu e do que não poderia mais ganhar. Foi a varanda e se jogou ao ar em busca da paz que dentro de si não encontrara mais. Se lançou ao infinito caos pelo monstro perverso que se tornara. O amor vacilou e ele pairou pelas ondas de vento no entardecer da cidade.

Lá no asfalto, os urubus de gravatas e minissaias se deliciavam com a compaixão macabra típica do humano. Mais uma nota para alimentar as páginas policiais do jornal de hoje, porque amanhã, será outro dia em busca de outro corpo...

2 comentários:

Anônimo disse...

hum....texto legal...O ser humano é bastante confuso mesmo...Nem ele consegue se entender...abraços

Renata Ferreira disse...

Uma delícia de ler esse texto, Wagner. Você realmente tem uma veia literária... "meu amigo, eh", eu vou dizer quando tu ficar famoso. rsrsrs
beijosssss